segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Mundos




Lembro-me que as minhas palavras eram o teu pensamento,
como se eu tivesse o poder de te escrever
sem que sequer me falasses.
Quando as minhas linhas eram outro mundo
e as minhas palavras eram tudo o que eu quisesse que fossem.
Podiam não ser alinhadas,
medidas ou bem escolhidas,
mas eram as minhas palavras,
os meus sonhos,
os meus recantos,
e eu era tanta gente...
Esta noite,
após tantas e tantas,
olhei para mim e soube
que as minhas palavras já não são aquilo que eu quero que sejam,
são um retrato triste e inconsciente
daquilo que eu e a minha realidade somos.
As linhas... são só linhas.
O meu sorriso já não são flores
nem o meu peito borboletas.
O meu caderno deixou de ser aquele livro de contos
e é agora um diário de pútrida realidade.
Não quero continuar a fugir para as minhas palavras,
não quero que elas me puxem de dentro de mim.
Desaparece,
larga a minha consciência,
sai da minha saudade,
mas deixa-me escrever,
desenhar novos velhos mundos
e voar até onde eu quiser.
Porque a minha realidade precisa de imaginação,
e a minha imaginação precisa de mim.







Ilustração de Bruno Clemente e texto de Leonor Figueiredo